terça-feira, 9 de setembro de 2025

O Frio do Sertão


O frio chega antes do sol,

entra pelas frestas das portas,

escorrega pelos cabelos,

como lembrança de um tempo que não volta.


No quintal, a terra treme sob os pés,

e o vento arrasta poeira e silêncio

entre mandacarus tortos e pedras gastas.

O gado resmunga longe,

e o eco é só dos próprios ossos.


As paredes de taipa guardam calor antigo,

mas nem sempre a lembrança aquece.

No fogão, a brasa morre devagar,

e a panela suspira, vazia de sustento.


A lua surge pálida,

refletida na água da cacimba,

onde o sertão se dobra sobre si mesmo,

como se rezasse a própria solidão.


Há um cheiro de chão frio e saudade,

um canto de aves que não encontram abrigo,

e o homem, encolhido no manto,

sente a pele e o espírito gelarem juntos.


Mas é nesse frio que o sertão se revela,

na dureza da pedra, na paciência do vento,

na esperança que brota mesmo em dias secos,

e no coração que insiste em bater

apesar de tudo, apesar do frio.


O frio do sertão é memória viva,

é história que se arrepia na pele,

é canto de mãe que já não chama ninguém,

é silêncio que fala mais que palavras.


E assim, ao fechar os olhos,

o homem sente o frio e sorri:

pois no sertão, até a geada

tem sabor de vida e promessa de manhã.




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