-Posso ter o seu amor
por uma estrela? por
uma concha de metal?
posso ter o seu amor
por uma palavra feita
de vinagre, de capim, feno?
Nessas noites escuras
por qual tenho passado
seu os seus abraços me
esquentando, vislumbro
a marca, a serena marca,
a marca pura e física,
a marca mais bela que
pode existir: a marca da
sua boca iluminada como
um vaga-lume no campo.
Tu e eu, companheira minha,
somos feitos disso: feitos do
campo verde e imenso dessas
terras, desses povoados tristes
e vazios, dessas colinas belas
onde meus olhos descansam
só para te ver estampada como
o luar, iluminada como o sol.
Posso ter o teu amor
em troca dessas coisas sem valor?
Tão sem valor, porque os corações
endurecidos de riquezas e pobrezas
dizem que o valor que nós damos a
nossa felicidade é abstrata.
Coitados! Não nasceram
no mesmo espaço onde tu e eu,
amor meu, pudemos existir.
Porque carregamos o
orvalho em nossas mãos,
carregamos as plantações,
as estrelas, as papeladas,
os barulhos dos grilos,
as canções das baleias,
as leituras da bíblia, a
solidão do prado e do cimento.
Amor, meu amor, minha amada,
posso ter o teu amor por essas coisas?
Daria os meus livros, o meu coração,
daria o meu amor, meu trigo,
daria a espiga da canção, o mel da rocha,
daria o que posso dar só para tê-la
a meu lado nesse frio e nessa imensidão.
Minha amada, não durmas ainda
enquanto o dia raia como uma espiga.
És a minha pássarinha que voa pelo
campo aberto e azul que me salta
da janela sempre que abro as cortinas
para vê-la: luz e mar que a saudade carrega.
Que será de mim sem amá-la?
Que será que será quando eu não tê-la mais?
Que será quando a aliança escorregar do dedo
e o amor, o infinito amor, o amor sem limites,
terminar? Que será quando não mais me amares?
Minha amada, vem enquanto
a chuva e as guerras não nos invadem a alma.
Vem, enquanto eu te pergunto:
-Posso ter o seu amor
por uma estrela? por
uma concha de metal?
posso ter o seu amor
por uma palavra feita
de vinagre, de capim, feno?