Era o ouro, brilhando por cima dos telhados,
uma chuva cheia de pequenos gafanhotos, rochas,
umas migalhas qualquer, um vento assoviando baixinho
nos teus ouvidos os versos perdidos do poeta,
eu te amo, dizia a água do mar lentamente, com garrafas e garfos,
eu te amo, respondia a nuvem branca e sem brilho,
eu te amo, dizia a vespa para a mariposa sem casa.
E tudo ardia com pontos infinitos escritos debaixo
da árvore, em cima do muro, perto da areia,
nem o ar parecia congelar as mãos que faziam poemas como candelabros,
morcegos, cegos aventais, dilemas esquecidos,
problemas políticos, estrofes apodrecidas de algas,
chuva, gotas de torneira, enxofre.
E abria a janela como se a televisão ligada fosse a
única porta da esperança, como se o elefante não tivesse pátria,
compondo o café, comprando o açúcar,
derramando o leite, a lágrima, fazendo poemas
de amor
para flores sem nomes, luas sem pratas,
mares sem peixes, nomes sem horizontes,
nada significando vida
a não ser a dor insuportável sentida na gengiva,
a dor do dente quebrado,
o mal cheiro que vem das odes das nuvens marinhas,
o pequeno aperto da mão,
a fruta que caiu espatifada
no chão.
E se vê estrelas brilhando negras em cima no céu,
coroadas de cores, luzes, brilhos que vão se apagando
porque não são nada além de ódios, rancores,
feridas abertas como
migalhas, pelos, portas,
a fumaça que se gera do
fogo ardido e finito contra
a rocha oceânica.
E chora
e chora
e canta.
E tudo se consome nesse século
de facebooks, myspaces, redes sociais
que interagem e tornam as máquinas humanas
e os humanos (?) em máquinas,
máquinas de não-dormir,
máquinas de trabalhar,
máquinas de ódio, máquinas de corrupção,
máquinas, máquinas, máquinas,
e tudo é rápido, tudo se acelera,
tudo vai e não volta,
tudo se desprende e gira
como a terra, como a terra
que é imóvel e fixa
e gira, e gira, e gira,
valsando contra o sol,
jubilando o espaço negro,
miragens de mariposas
sem asas no meio do
espaço cosmos.
É impossível escrever poesia
nesse século frio, nesse século de cinema,
nesse século vazio, vazio como o buraco,
vazio como o rio que se vai infinito,
A grama verde é a esperança,
a chuva azul molhando o amor de olhos de gotas,
o negro sol queimando as margaridas,
o outono vermelho pegando o verão cinzento
e beijando o licor e a prata e o café com leite.
E nós choramos porque entendemos.
Por que entendemos?
Entendemos que morremos
nessas calçadas
esburacadas.
E tudo é ausência e frio.
Tudo é ladrilho, casas, pessoas.
Os muros sem animais, o teto
que pinga, os lírios, as pequenas
margaridas, os pequenos insetos.
E nós passeamos nosso olhos de letras e números cheios de
bactérias e coisas assim como o redemunho desenhos abstratos
a ilógica lógica do surrealismo as pinturas de miró os desejos contidos
os desejos incontidos os versos de pessoa o vinagre escovando
os dentes com sal açúcar mel serpentinas vendo e amando as
moças orientais as moças morenas a amada que me trocou
pelo corpo e pela água morna pela luz sem fim do muro e
o rosto da morte cantando versos atuando com o luar uma
canção branca uma ode lenta um pequeno sol brilhando
escurecendo o vento passando pela entrada do portão que
tem o perfume da árvore sem nome que chamam de dama da noite
e outrora
as horas
serão.