CADEIRA N. 21
SIC TRANSIT GLORIA MUNDI - Gostaria de começar o meu discurso com essa frase, que vertida ao português significa: A GLÓRIA DO MUNDO É TRANSITÓRIA.
Aqui estou eu, adamantinense de minha pequena Adamantina. Eu nasci e vivi meus primeiros anos nessa cidade do interior paulista. Os primeiros anos, os primeiros amigos, os primeiros amores, tudo para mim teve uma significação profunda.
E eu sou profundamente religioso.
Aqui estou eu. Gostaria de começar o meu discurso falando da minha infância... Quantos erros eu cometi nessa idade, quantas aventuras. Tudo começou comigo pequeno, as primeiras leituras, os primeiros autores, os primeiros filmes assistidos, os primeiros diálogos amorosos na escola. Quantas coisas eu posso deixar nesse discurso de agradecimento e de posse. O que me espanta, é que não me lembro bem o como me tornei um escritor. Em outras palavras, não sei como e porquê virei um poeta.
O que faz um poeta? Descreve as misérias do seu povo, recebe o carinho de sua querida amada, sustenta em palavras o mel enigmático da vida, observa os pássaros imitando-os, ouve a voz do Criador, rompe com o próprio ser, diferencia dos outros seres o que jamais poderia ser diferenciado?
Me tornei poeta por uma razão muito óbvia: no principio quis eu ser um escritor, e todas às noites enquanto todos em minha casa cochilavam em seus sonhos secretos eu, aventureiro de carteirinha, sentava-me diariamente em frente a mesa com papel e caneta-bic azulada, desejoso de nascer dentro de mim e das veias de minha mão, centenas de romances regionais e belos como o de G. Rosa, Jorge Amado.
Nada me brotava. Tudo era uma luta corporal sem sentido. Desculpem-me os prosadores desse lugar magnífico, a prosa jamais foi uma amante desejada por minhas entranhas.
A tristeza e a depressão de nunca concluir uma frase sequer de um capítulo, me deixavam triste e amargoso. E foi nessa luz de tristeza profunda, que meu irmão mais velho, Leonardo Lima, trouxe da escola um livro de poesia de Manuel Bandeira. E eu lia.
Eu lia muito, e gostei de ler os poemas desse poeta dentuço.
Decorei vários dos seus poemas, "OS SAPOS" me marcou, pois achei-o uma genialidade, e jamais suspeitaria que aquele poema era uma sátira aos parnasianos que tanto admiro.
Manuel me mostrou o caminho, e passei a versejar. Mais nada do que eu fazia poder-se-ia comparar-se com as linhas do Mestre.
Tudo era mar, amar, rimar, sonhar, ganhar, ficar, beijar, degustar, desejar, e eu não sai de poemas marinhos.
Quantos poemas eu fiz para o mar sem nunca tê-lo conhecido. Fiz mais poemas para o mar do que o profeta Davi fez poemas para Deus. E o mar jamais tomou conhecimento desse meu impulso primário em imitar o Mestre Bandeira.
Não, eu não era poeta. Eu era uma geladeira.
Até que me caiu nas mãos um livro de poesia grosso e completamente sincero, de um mineiro tão capiau e simples, que os meus dedos se arrepiaram de prazer em ler tais escritor.
Drummond marcou o caminho para mim (assim como para muitos). Mais eu ainda não me considerava poeta.
Isso no estágio adolescente de não saber-se criança ou adulto. Foi então que o verdadeiro Mestre apareceu em minha frente, o pernambucano seco, João Cabral de Melo Neto.
O que me uniu a um poeta seco, clandestino, incapaz de auto-confidenciar um beijo para a namorada? Pois tudo isso eu fiz e faço. Nerudiano autoritário como sou.
Porém, quem me mostrou o caminho do fazer, engendrar poesia, foi esse maravilhoso recifense, e daí por diante, nas linhas de tal autor, eu me pus a declarar-me um poeta.
Mamãe e papai são personagens maravilhosos de minha vida. Dois trabalhadores, é claro, e como tais diferente da visão de um filho intelectualizado e sem pretensões na vida.
Como disse eu sempre fui muito religioso e isso me aproximou muitíssimo das obras do ocupante antigo dessa cadeira: PAULO COELHO.
No começo eu achava suas obras feitas para a apreciação de fadas. O meu sonho era ser um santo escritor, mais nunca me parecia isso concluído. O que um diário de um mago pode significar para mim? Nada. Impossível. Esse Sr. Coelho é um autor horripilante. Passei a ler um outro livro, para ver se realmente eu estava sentindo as minhas opiniões ou se eu estava copiando um lugar-comum diante desse autor de best-sellers ilegível.
O ALQUIMISTA foi para mim uma revelação de luz. Uma estrela cadente no meio do cosmos da terra, do Brasil. Nunca tinha lido nada tão maravilhoso, simples, elaborado e despretensioso. A fábula me ganhou e me comprou. Daí por diante, eu, um cristão-protestante incapaz de gostar dos rituais católicos, passei a admirar e a me influenciar por um autor católico.
Não retiro minhas impressões do primeiro livro, mais os outros que li, VERONIKA DECIDE MORRER, O ZAHIR, NAS MARGENS DO RIO PIEDRA..., todos de uma beleza simples, santa, incalculável.
Não sou de ver anjos, mais admiro a ousadia de um homem como esse, não porque estou a sentar-me numa cadeira que já foi ocupada por ele, mais por sua qualidade literária, que sim eu suponho que possa ser comparada a uma parábola de Jesus.
Agradeço simplesmente a todos por esse momento, por essa graça que D'us, meu Senhor Jesus me concede. Lembrando a frase que iniciei o discurso: SIC TRANSIT GLORIA MUNDI.
Só o amor não é transitório.
Obrigado.
Gabriel de Ataide Lima
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