TERMINO
conto
Ana olhou o relógio na parede mais uma vez. Ela sabia que Paulo estava atrasado, e ele sabia muito bem que ela detestava se atrasar, claro que por causa da sua origem, já que tinha nascido na Suiça, e os suíços gostam de ser muito pontuais.
A porta do estabelecimento se abriu, e Paulo entrou. Como sempre ele estava de preto, com aquele ar de intelectual moribundo que ela conhecia muito bem.
Nas mãos ele segurava um livro, claro, afinal ele nunca deixava de estar com um livro, já que era um homem do mundo das letras. A imensa barba negra negr um ar de judeu ortodoxo, embora ela sabia que ele era apenas um descendente de português de Alentejo.
"Demorei muito?", ele perguntou ao se sentar na mesa.
"O suficiente", ela respondeu, "pra mim tomar uns dois choops".
"Não tive culpa, você sabe Ana. Está chovendo muito ali fora. O sinal do celular não pega. Queria te avisar do atraso".
"Tudo bem, Paulo. Não tem problema, você já chegou. E é isso o que importa".
Paulo parecia um pouco encabulado com a resposta de Ana. Ela parecia um pouco aborrecida com ele, realmente ela detestava atrasos.
"Que livro é esse?" ela perguntou quebrando o gelo do silêncio entre os dois.
"Um livro do Carlos Castaneda, muito bom, se passa no deserto do Atacama", Paulo parecia animado com o assunto, mais Ana não deixou ele prosseguir.
"Não gosto do Castaneda!", ela disse mechendo nervosa com os dedos na toalha da mesa. Sabia que Paulo se magoaria com isso, mais não adiantava mentir só para agradar ele, sabendo que não gostava da obra do cara.
"Ana, o que você quer comigo aqui? Você não gosta de nada que eu gosto. Eu curto magia, curto Borges, curto telepatia, curto Carlos Castaneda. Curti você. Só que parece que não estamos mais em sintonia."
Ana olhou Paulo no fundo dos olhos. Seus olhos eram verdes como uma folha de amora, mais os olhos de Paulo eram escuros como uma noite fria, cheios de mistérios óculos, ela não conseguia ler seus olhos. Ela já não podia mais ficar com ele.
"Paulo, a gente tem que terminar. O nosso relacionamento não dá mais certo."
Paulo olhou para o lado. Se sentiu triste. O que tinha que ser seria. Ele levantou.
"Tudo bem, Ana, espero que você seja feliz e encontre o que está procurando".
Ele saiu, e a chuva lá fora aumentou de volume. Os trovões soaram forte como se a ira dos deuses pagãos tivessem sido despertadas. Um forte vento entrou pela fresta da porta fazendo o sino do lugar tocar.
Ana ficou ali sentada. Antes de ir embora ela pediu um café para o garçom.
Nenhum comentário:
Postar um comentário