domingo, 14 de dezembro de 2025

A Praça

 O sol já passava do meio-dia quando cheguei à praça. Era uma daquelas praças que ainda conservam a gentileza de antigamente, com árvores frondosas que estendiam seus galhos como braços acolhedores, bancos de madeira escura polidos pelo tempo e pelo corpo de incontáveis solitários e amantes, e um chafariz no centro, cuja água, ora vigorosa, ora suave, murmurava uma canção constante. Não havia pressa em mim, nem compromisso. Apenas a vontade de sentir o tempo escoar de uma forma diferente, longe do ritmo frenético dos relógios e das telas.

Escolhi um banco sob a copa de uma figueira imponente. Ali, a sombra era farta e fresca, e o vento, quando passava, trazia consigo o cheiro de terra molhada e flores de jasmim que eu nem sabia de onde vinham. Tirei o livro da mochila, mas as palavras demoraram a se fixar. Meus olhos se perdiam nas miudezas da vida da praça. Vi um casal de idosos de mãos dadas, caminhando lentamente, como se cada passo fosse uma celebração da longevidade partilhada. Um grupo de crianças brincava de pega-pega, suas risadas agudas cortando o ar, um som que me fez lembrar de um tempo distante onde a maior preocupação era fugir do "pegador". Havia também um homem de terno, sentado em outro banco, com um ar grave, folheando um jornal com uma concentração quase dolorosa. Que segredos ou preocupações estariam escondidos entre aquelas páginas ou em sua mente?

A tarde avançava sem que eu percebesse. A luz do sol começou a mudar, os dourados se intensificando, as sombras se alongando, desenhando figuras fantásticas no chão de terra batida. O burburinho da praça se alterou. As crianças foram sendo recolhidas por mães e avós, os idosos já não estavam lá, e o homem do jornal tinha desaparecido. Agora, era o tempo dos jovens casais, que se aninhavam nos bancos, sussurrando segredos e trocando carinhos, e de alguns poucos corredores, que passavam apressados, com fones de ouvido e rostos focados.

Eu me permiti ser um observador silencioso, um fantasma que absorvia cada detalhe. O ar ficou mais frio, um presságio da noite que se aproximava. O chafariz continuava sua canção, mas agora parecia mais melancólico, mais introspectivo. As primeiras luzes dos postes se acenderam, pontinhos amarelos que competiam timidamente com o último alento do crepúsculo. O livro, esquecido, repousava ao meu lado. Não importava. A praça havia me contado histórias muito mais interessantes do que qualquer ficção.

Quando a noite finalmente engoliu os últimos resquícios de luz, e as estrelas começaram a surgir, pálidas no céu ainda um pouco tingido de azul-escuro, levantei-me do banco. Senti um leve formigamento nas pernas, mas uma agradável sensação de leveza na alma. A praça, agora quase deserta, era um convite à contemplação, um oásis de quietude em meio ao caos da cidade.

Caminhei de volta para casa, meus passos ecoando no silêncio da rua. As luzes das casas já estavam acesas, janelas que revelavam breves cenas de vidas alheias. Não era mais o mesmo homem que havia saído de manhã. Havia algo de novo em mim, algo que a praça me dera: a percepção aguda da beleza no ordinário, a efemeridade do tempo, e a persistência da vida em suas múltiplas formas. E, ao entrar em casa, a lembrança do cheiro do jasmim e do murmúrio do chafariz ainda pairava no ar, uma suave promessa de que a praça estaria lá, esperando por mim, amanhã ou em outro dia qualquer.

Nenhum comentário:

Postar um comentário