quinta-feira, 22 de junho de 2017

Valsa do sonho

Alguém sonhou,

duvido que foi o outono embelezado de horizontes,
cores, pequenas folhas caídas pelo corpo,
nos ombros uma montanha elevadíssima,
em baixo, nas mãos, segurando uma aurora
uma lua feita de lixo, um sol cheio de poentas enegrecidos.
Ninguém falou no momento intenso da música,
quando a brisa valsava contra a rosa ludibriada
de canções extintas, vasos, sementes, 
uma beleza inconfundível de marinheira,
a beleza destratada, arremessada no chão,
aberta, ferida, cheia de cascos, lunetas,
muros que se perdem no meio dos mapas.

E a noite se confundia dentro de mim como
um arpão, peixe-espada, foscos, flocos.
O enfeite do coração era meio semelhante a
uma adaga, uma meia cheia de chulé, uma casa
abotoada de botões, nadadeiras, patos.
Rabiscando em cima do muro outra canção,
desenhando outros desenhos, outras taças,
uma garrafa de guaraná, um desejo obscuro.

Disseram e não disseram
e a melodia se perdeu como um arranha-céu
no centro da cidade, uma mosca dentro da sopa,
uma roupa rasgada, uma tabuada, 
um lírio jogado, destratado no chão.

Mesmo se pudesse ser dor
alguém iria contestar as asneiras poéticas:
sereias engarrafadas dentro do coração,
morenas voando como águias,
brisas em forma de folhas de papel,
palavras chamuscadas de pelos e ventanias.
Tudo é passageiro, dirá o bilhete escrito do outro lado
da janela com desenhinhos e votos, juras de amor eternos.

E sangra o coração.
Sangra? Canta! Na verdade as baladas
antigas são muito boas, e mesmo que
o corpo não se move, uma lua aparece
pelo céu coroada de folhas verdes,
jogadas no meio dos números.

Sonhos como areias, sonhos como
pequenas peneiras, sonhos iguais
tijolos, livros, fogos-de-artificio, 
cajados, ovelhas, óculos, a bíblia,
o lírio, os jardins, as raízes estremecidas,
os cheiros de tulipa, o murmurar do mar,
as ondas sem escritos,
as palavras sem sentido,
os papéis queimados e os livros
jogados na lata de lixo.

E somos dois
se amando no céu,
encurvados dentro do amor,
no ar severo da paixão.
Cantamos por entre as nuvens, entre o mar sem luvas,
perto do trovão, em cima da rocha,
dentro da manhã, coroados de plumas.

assim desperta
entre os lírios e o perfume.

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