quinta-feira, 14 de agosto de 2025

o cemitério barroco



na noite de sevilha,

um homem pensou em partir.

a tristeza era um rio espesso,

que não corria para o mar.

murilo, com olhos abertos,

guardou o amigo do silêncio,

como quem vela uma chama

que o vento ameaça soprar.


mas a manhã chegou

com sua claridade oblíqua,

e o homem anunciou:

— não partirei.

não foi a vida que o reteve,

nem a súbita doçura do mundo,

mas a imagem de seu corpo

sob um mármore barroco,

com anjos gordos,

cachos de pedra,

e volutas que o sufocariam para sempre.


ele, que amava o traço limpo,

a arquitetura nua,

não poderia repousar

numa prisão de excessos.

e assim ficou.

não por amor à vida,

mas por horror ao ornamento,

por fidelidade ao desenho claro

que sempre perseguiu —

até no descanso final.



Nenhum comentário:

Postar um comentário