desceu como quem não desce, mas despenca em si mesmo,
o homem, não o herói, muito menos santo, apenas o homem,
foi até o balcão gasto, pediu um conhaque,
e o copo veio pequeno demais, como se o mundo inteiro tivesse encolhido,
tomou de um só trago, porque não havia tempo para goles educados,
e logo, do fundo do bar, a puta mais linda,
essa definição tão objetiva e tão inútil,
o olhava com a paciência de quem já vira séculos de homens
a acreditarem que eram escolhidos,
e ele, nesse instante, acreditou, porque acreditar é sempre mais fácil que pensar,
subiu então, e subir era também um verbo que servia para escadas, para camas, para cruzes,
entrou no quarto barato que cheirava a perfume esquecido,
puxou o caderno, a caneta, escreveu algumas linhas que nem ele entendeu,
e ninguém depois entenderia,
mas é assim que nasce a literatura, no calor da pressa e do álcool,
depois abriu a gaveta, encontrou a arma,
pesada como as palavras que não soubera dizer antes,
e ali ficou, entre mirar no espelho ou mirar no vazio,
se matou ou não, não se sabe,
porque ninguém ouviu disparo, ninguém ouviu grito,
talvez tenha dormido, talvez tenha acordado,
talvez tenha sonhado que viver é apenas isso,
um gole, um olhar, uma frase escrita,
e a mão que hesita entre atirar ou voltar ao balcão.
24-08-2025
Campinas, Sampa - Brasil, América do Sul
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