Agora que eu adormeci e meus sonhos
se tornaram o vinagre amargo das solidões
precisei implorar para ganhar algumas esmolas
mas pelo visto ninguém ouviu meus gritos.
Depois que o tempo se tornou um blue,
depois que eu marquei meus olhos com cosmopolitismos,
depois que os livros foram vendidos nos sábados,
sim, eu mesmo, eu, o agreste agricultor literário
vi o rio brilhando com pedras enigmáticas e mortos.
Fui lembrando desesperado da escola,
a suja e imunda escola da humanidade, onde os homens
são porcos do trabalho e o trabalho humano é uma lavagem,
porque os ricos descansam em cima dos pobres e os pobres
são meros coitados.
Mas não ouviram porque me colocaram em cima do muro
e com o dedo em riste me chamaram de vagabundo.
Mas, vagabundo de quê? Das colheitas ou das mariposas?
Porque quando me procuraram já me acharam com os mortos.
Eu não estava na tumba.
Não, não estava,
não estava na areia, nem no céu,
nem no fim do mundo.
Mas quando levantaram as cabeças cortadas
viram dois profetas apontando para um rio,
um silencioso rio onde a voz de Deus se debruçava.
E dois anjos apontavam para mim e com os meus olhos
os soluçantes gritos brilhavam como duas espadas alvas.
-Que fazes aí, Gabriel? Perguntaram, com as mãos molhadas.
Mas eu estava morto, não estava?
Minhas mãos inchadas de poemas agora estavam
cortadas no meio do nilo,
meus olhos cheios de exílios vinham para alegrar
as gaivotas com mares e saudades.
Naufragado, sozinho, o rio foi se debruçando de
cima
e tornou-se uma esperança de miragens.
Então eu encontrei um só amigo,
o nublado coração inchado acelerou
e enquanto gotas de mel enchiam os olhos
febres amarelas arrastavam os pés para a meia sombra.
Onde estava? Não estava.
E pelo meio dos troncos
pequenas cigarras cantavam
impacientes pela ressurreição dos mortos,
e a lua ia ditando aos escrivães do céu
os nomes dos sufocados pelas fumaças.
O mar delirando versos angustiava
seus mortos e o desaparecido papel
das colinas ia recitando poemas de amores.
Enquanto o coração despertava
o rio foi se tornando azul, porque o vermelho do sol
não aguentou tanta dor de metáforas.
Não nos venceram, com certeza, nunca elegeram.
Depositaram no meio do rio a rebeldia dos meus olhos,
enquanto os querubins de natal luziam pelo céu,
estrelas caiam em cima dos coqueiros esquecidos,
e o amor transpirava, sofrendo, vivo.
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