sábado, 9 de dezembro de 2017

Retrato da cidade



Estamos andando, andando,
nunca chegamos a lugar nenhuma.
As ruas são largas, o asfalto é horrendo,
é claro que combina com a cidade.

Quantos buracos!, a cada meio metro
podemos ver uma piscina de água-marrom
sempre que chove a lenta chuva.
As calçadas estão carcomidas, 
                                             com toda certeza
os reparos vão ficar para o futuro,
afinal
esse não é o país do futuro?!

Repare bem, porque tudo nessa
cidade é feita de reparações (é um povo muito reparador):
o céu de manhã camufla as nuvens com o sol
e elas ganham um tom alaranjado indescritível
de tão belo.

Algumas araras estão em cima dos fios de eletricidade,
fazendo companhias as orquídeas solitárias
que respiram no meio dos mesmos fios.
Ah, tem outra nação capaz de fazer um
espetáculo tão belo quanto esse? 
Natureza e energia juntas. Ambas não são
a mesma coisa?

Essas dúvidas tem que ficar para trás.
Estamos com pressa para chegar no trabalho.
Pressa, carros apressados se atropelam
um do lado do outro nessas ruas cinzentas, feias.

Cuidado ao atravessar a rua, poeta,
eles sinalizam para o pedestre
aumentando a velocidade.
Vão chegar aonde mesmo?

Ah, ao trabalho, suponho.
O melhor trabalho seria ficar olhando
as marias-sem-vergonhas que
vemos nas calçadas.

São tantas, e são tão coloridas.
Umas são amarelas, outras brancas.
A mais bonita é a rosada.
Parecem estar realmente com vergonha.

E os pardais enfileirados, em cima das telhas?
Um, dois, três. Não passam de seis.
E são tão tímidos. Com um gesto
se espantam, fogem voando.

Sério, se não fosse a natureza em volta
eu diria que essas casas são tumbas
e a cidade não passa de um cemitério,
e andamos cercados por fantasmas.

É melhor correr apressado,
tentando imitar esses carros acelerados.
O motivo é o mais simples possível:
o céu escurecido é sinal de tempestade.

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