sábado, 13 de outubro de 2012

Ricardo Rodecía escreve a noite (conto)


 Ricardo Rodecía vivia sobre a beleza da plenitude da rica burguesia de Buenos Aires. Sabia que era um privilegiado, mais nem por isso deixava de rir de suas próprias mazelas (ou as mazelas da sociedade rica e culta que o cercava). Ricardo Rodecía escrevia poesia, embora fosse um poeta desapegado a tudo o que fosse sentimental. Ora, o que se resume um poeta sem sentimentos?, perguntava-lhe Cíntia Doniñelas, uma rica filha de um venerado gaúcho que se tornou um caudilho capaz de crueldade maiores que a de Perón.
Mais Ricardo Rodecía sabia que a poesia não poderia ser apenas sensações. Ele achava que a poesia deveria ser uma mistura de dor, embora uma dor completamente matura. Ora, é impossível uma dor ser imatura!, desafiava-lhe novamente Cíntia Doniñelas. Uma dor é uma dor em qualquer circunstâncias, mesmo nas mais Imaturas.
Ricardo Rodecía servia como um trampolim para os senhores e senhoras ricos de Buenos Aires ou qualquer outra parte da Argentina (até mesmo do Uruguay, pois segundo Rodecía, o que diferenciava os dois países era a beleza do bife argentino e a depressão alegre dos urugaios). Apenas escrevia a noite, diante do céu medonho e das luzes horripilantes dos piores guetos da Argentina. O que é até algo ou coisa curiosa: ele não pertencia a zona sul e sim vinha da riqueza porteña dos grandiosos bairros de Recoleta, Palermo, Belgrano... Sua mãe era Augusta Elína Valdiór. Embora o nome pareça ser uma copla de españolismos ou coisas assim, Augusta era nascia no Brasil, na parte mais rica do Rio Grande do Sul, e mudara-se com o seus pais com dois anos para Buenos Aires. Ali, entre a riqueza e a pobreza, conheceu Manuel Rodecía, militar e poeta nas horas vagas, apoiador do lema da GOU, que dizia: “uma vez caído o Brasil, o continente sul-americano será nosso”. O que talvez seja até irônico: filho da nobreza por um lado, e por outro, herdeiro dos grandes militares da Nação Gaúcha.
 Ricardo Rodecía poderia se dizer apenas, um grandioso burguês de características bandidisticas. Pois era um criminoso nas horas vagas. Por puro prazer talvez, pois jamais passara por fome (nunca involuntariamente  pelo o que se sabe). Escrevia sobre os temas horrorosos e medíocres  que o cercava... E aliás, era um grande admirador de Borges. Dizia que babava sempre por qualquer linha escrita por Borges. Era um Borgeólogo convicto de plenitude incríveis. Não que fosse argentino como todos os outros: arrogante de si. Segundo ele, Borges era talvez o superior aos escritores latinos/americanos/europeus/russos, mais sem jamais deixar de ser um bom poeta pastoril  Talvez as latitudes geográficas de Ricardo Rodecía apenas esbarra-se na mirrada e ignorante geografia do Cone Sul. Mais antes de completar 12 anos, já havia conhecido os poetas mirrados e ignorantes do Peru, até as praias desertas de Valparaíso no Chile.
 Mantinha sempre a elegância ao escrever suas linhas mau-traçadas em sua letra culta e bela.
Ó que quem me espera
Morre sem vela nua
Crua como a carne
Morra quem me espera.
E sobre as luzes dos bairros ricos em direção aos pobres, Ricardo Rodecía escrevia comovido, no alarde da noite, mais nem se preocupava em ligar para a polícia para constar do assassinato que ocorrera diante dos seus olhos (o que aliás resultou em um ótimo poema):
Sobre a carga das Luzes
Que me cercam diante do nada
Nada e eu entre eu e nada
A morte dela dele de quem for
Não me afasta os fantasmas da
Vida que tive tenho e terei!
Fim.

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