sábado, 16 de agosto de 2025

O POVO DE GELO, O POVO DE LUZ


os suecos —

não são apenas homens e mulheres,

são uma ideia.

um conceito que o frio moldou

como se o inverno fosse escultor,

e a neve, sua biblioteca silenciosa.


olho para eles,

esses nórdicos de olhos azuis,

e vejo não pessoas,

mas espelhos do infinito:

lagoas imóveis,

reflexos daquilo que nunca muda.


talvez sejam uma metáfora.

talvez nunca tenham existido,

e sejam apenas o sonho de um latino,

de um poeta obscuro perdido em um bar

da cidade de são paulo ou buenos aires,

imaginando o norte como um mito:

um labirinto de gelo

onde o tempo não passa,

onde a morte não apodrece,

onde a beleza é apenas disciplina.


as mulheres suecas

são colunas de cristal,

e caminham como se o chão

fosse inventado a cada passo.

seus cabelos são a lembrança

do sol aprisionado,

seus corpos —

a geometria da ordem

que nós, filhos do caos tropical,

jamais alcançaremos.


os homens suecos

parecem repetir-se,

como se um só rosto

tivesse sido esculpido mil vezes

em mármore frio.

mas dentro deles, quem sabe?

há labirintos também,

há dúvidas também,

há, talvez,

um poema de maiakóvski

escondido sob o gelo.


e eu, latino,

poeta que escreve contra a corrente,

admiro e desconfio:

pois sei que a perfeição é máscara,

e que atrás dos olhos transparentes

há também sombras,

como em toda carne,

como em todo povo.


assim, escrevo:

os suecos são uma ficção.

não de um só autor,

mas de muitos —

homero, borges, maiakóvski,

e de cada estrangeiro

que os olha como quem olha

um mapa de estrelas:

frio, ordenado,

mas ainda um mistério.



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