O POETA
Eu, eu quando canto, canto todas as coisas.
Suspira dentro de mim todas as matérias, todos
os átomos sinistros da existência.
O frio e o fogo me consomem. A minha
carne, o meu espírito, o meu ser é constelado
de estrelas, é feito de marés e ondas espumosas.
Eu, eu quando canto, canto todas as coisas.
E é preciso cantá-las antes que o ferrugem
e o esquecimento a tomem por fora e por dentro.
Por isso tudo cabe no meu canto: os pássaros
vagabundos, os trabalhadores das usinas, os
mendigos do grande centro, os pardais nas casas.
E eu sigo cantando todas as coisas, tudo o que é
vivo e tudo o que é morto, sinistro e metafísico.
Sigo, e vou cantando como qualquer um,
abrindo espaços entre as palavras nebulosas e
rubras com o fogo. Vou abrindo as serpentes
dos meus versos para serem engolidos pelas
coisas, pelos objetos comuns, pelo cotidiano
tedioso e revigorante.
Por isso vou cantando todas as coisas que eu
quero, desde a prateleira cheia de teias e livros,
até o seu rosto azul, consumido de amor selvagem.
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