- em homenagem a ferreira gullar
Ele caminha pela rua molhada da madrugada,
passos ecoando sobre o asfalto quente,
e Natal não é mais festa, é luzes piscando em vão.
No mercado, entre cheiro de peixe e café,
ele observa rostos que sorriem sem saber de nada,
como se a cidade inteira fosse um teatro barato.
Seu chapéu velho inclina-se sobre os olhos cansados,
mas não há cansaço que esconda a fome de mundos.
Cada esquina guarda um segredo, cada bar uma promessa
de carne, de vinho, de esquecimento.
E ele sorri, mordendo o lábio, lembrando da mãe,
do pão assado nas manhãs de inverno,
do riso contido que queimava como brasa.
No calçadão, a lua reflete em seus olhos
e Natal se curva diante da sua sombra.
Ele toca o som do vento que atravessa coqueiros,
respira sal, saudade, pecado e desejo.
O judeu em Natal não é estrangeiro,
mas também não é de ninguém.
Ele é cidade, noite, mar,
e ainda assim se pergunta se haverá alguém
capaz de decifrar o mistério que ele carrega no corpo.
E quando a aurora se derrama sobre a cidade,
ele some entre carros e buzinas,
levando consigo a poesia que ninguém lê,
a sensualidade que ninguém toca,
o exílio de todos os dias,
a eternidade de um instante.
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