segunda-feira, 15 de setembro de 2025

O Judeu em Natal


 - em homenagem a ferreira gullar



Ele caminha pela rua molhada da madrugada,

passos ecoando sobre o asfalto quente,

e Natal não é mais festa, é luzes piscando em vão.

No mercado, entre cheiro de peixe e café,

ele observa rostos que sorriem sem saber de nada,

como se a cidade inteira fosse um teatro barato.


Seu chapéu velho inclina-se sobre os olhos cansados,

mas não há cansaço que esconda a fome de mundos.

Cada esquina guarda um segredo, cada bar uma promessa

de carne, de vinho, de esquecimento.

E ele sorri, mordendo o lábio, lembrando da mãe,

do pão assado nas manhãs de inverno,

do riso contido que queimava como brasa.


No calçadão, a lua reflete em seus olhos

e Natal se curva diante da sua sombra.

Ele toca o som do vento que atravessa coqueiros,

respira sal, saudade, pecado e desejo.

O judeu em Natal não é estrangeiro,

mas também não é de ninguém.

Ele é cidade, noite, mar,

e ainda assim se pergunta se haverá alguém

capaz de decifrar o mistério que ele carrega no corpo.


E quando a aurora se derrama sobre a cidade,

ele some entre carros e buzinas,

levando consigo a poesia que ninguém lê,

a sensualidade que ninguém toca,

o exílio de todos os dias,

a eternidade de um instante.



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