...com o coração quebrado de inverno e dor...
Eu era aquele sonho de
nuvem dissipado a beira do campo.
Meu querido luar e meu querido por-do-sol
embalsamavam minhas mãos
frias e tristes, solitárias no campo.
Mesmo assim eu carregava em
meus pensamentos as lágrimas
de uma maça, os desejos de uma
árvore por água, por vida, por terra.
Quantas lágrimas eu tinha
de oriente e de ocidente. Lágrimas
como grilinhos errantes, como
baleias sem rumos, aves cheias
de silêncios e dúvidas.
Praticamente o oceano era o meu coração,
assim como o marfim, o lodo, a selvagem
palavra, o xingamento, a errante voz,
os músicos, os instrumentos quebrados,
as melodias das cantoras, as vozes dos cantores,
a tempestade e o rubi dos teus olhos
me incendiando o peito, a dúvida, a composição.
Era e não era. A primavera e o outono.
Não me viram? Será que realmente não
me viram? Não me viram nas igrejas,
nas gráficas, nas bibliotecas, nas ruas,
nos solitários bosques, nos imensos
edifícios, nos solitários becos, dentro
de uma construção, fora de uma casca,
dentro de minha casa, dentro de meus pais,
dentro de meu país silencioso e triste,
dentro de minha esposa, dentro da flecha
de meus filhos, dentro da morte, dentro
da alma dos meus antepassados, dos
meus avôs do norte, dos meus bisavôs
portugueses, dos meus suspiros judaicos,
dos meus anseios latinos, das minhas vontades,
dos meus embaralhamentos, dos meus teatros,
dos meus poemas, da minha morte e da minha vida?
Não me viram? Não, não me encontraram.
Que será que estavam fazendo
quando eu sofria tentando trabalhar a melodia?
Que será que eles queriam?
O meu tempo por dinheiro,
minhas fezes por ganancias,
meus ouros por comida,
meus sapatos por estrelas,
minhas roupas por colheres,
meus olhos por lágrimas?
Deixei minhas mãos se apagando
na folha, o relógio quebrado vazou
meus garfos, ai, ai, ai, eu podia cantar
como um gato para a lua e para o horizonte.
Eu duvido dessa bondade cristã
dessas vírgulas desses matemáticos
desses dilemas, desses falsos profetas,
eu duvido, eu duvido, eu duvido
eu suplico, eu suplico, eu suplico.
Não ouvem a voz sonora de Jesus Cristo?
Agora eu me vou porque é tarde.
Não adianta brigarem comigo.
Eu não mudo. A vida muda.
Eu sou surdo. Estou cego e mudo.
E da próxima vez quem carregar o
meu cadáver será a vida e não a
morte.
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