quarta-feira, 4 de setembro de 2024

Teshuvot



Teshuvot
Onde quer que eu esteja
onde quer que eu vou
vejo fantasmas e estrelas
e lá está o rosto dela
o rosto dela, perdido na
nuvem rosada da memória.
Ay, quantas lembranças
sombrias um homem só
pode ter todo dia de sua
tristíssima vida de calango.
E ali estava ela, ouro e prata,
dizendo algo que eu não
podia entender, nem compreender.
Eu apenas sabia que me queria bem.
E as retilíneas vozes me
carregavam como anjos sem asas.
Eu já não era eu mesmo,
eu era um pássaro, um avião,
uma folha varrida para longe.
Então descobri que eu estava morto.
Morto, se mãos nem pés,
congelado na canção do mar.
E meus amigos me chamaram
pelas ruas desertas.
Eu não estava lá, eles não me viram.
Não acharam meu esqueleto.
Não me encontraram. Por que, meu Deus?
Por que não me encontraram?
E deu -meia-noite, e houve festas.
E fogos de artifícios comemoravam,
o ano-novo.
O mesmo ano-novo de novo.
Então despertei suado e com o
pau mais duro do que o ferro de um navio.
Tudo fora um sonho, Carlos Drummond,
tudo não passou de um sonho,
um belo sonho digno de uma peça de Lorca.
E então eu vi que eu estava ali,
sentado, triste, no escuro,
e a luz do sol me iluminou pela última vez.

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