segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Seis fragmentos

1- Ela disse que lia Pablo Neruda com muito afinco, mais que não consegui entender ou compreender os poemas de Residência en La Tierra. Como pode então ela se interessar por Neruda se não consegue nem ao menos entender o seu melhor livro de poesia? Quantos anos ela tinha naquela época em que eu era um vagabundo, míope e leitor? 15! Quinze anos e já era uma gostosona, aparentando ter pelo menos uns dezessete anos. Que tragédia seria dizer para ela que eu só gostava do Neruda surreal e de suas odes. O que posso fazer? Ela sempre foi muito romântica, coisa que nem sequer consigo ser, embora finjo com total afinco ser o que não consigo ser: romântico.
2- Então os nosso olhos se cruzaram em uma cafeteria. Estava escuro, era umas nove horas da noite, um livro de Baudelaire; meu amigo estava olhando as nádegas de uma louraça boazuda que passava por nós. Nas mãos dele um livro de Mallarmé. Na verdade, nunca gostei (ou melhor, admirei) a poesia francesa. É muita coisa para se sentir, e acho que os franceses são tão literais que chegam ser falhos. Eu gosto de ler os franceses, e Mallarmé é genial, e Baudelaire não é um autor pão com leite que muitos pensam; eu estava lendo suas poesias enquanto ela pedia um café e sentava-se quase próxima de mim, um pouquinho afastada é claro. Eu gosto de pessoas que leiam, e eu gosto mesmo é de ler, e admiro pessoas que leem pelo menos poesia francesa. Não se lia muita poesia francesa durante minha infância, aliás ninguém lia a não ser eu dentro da escola: meninas querendo fazer sexo com meninos que queriam transar com as meninas que queriam fazer sexo com ele, e eu lia, lia, lia. Pronto, ela ali, com a mesma altura, o mesmo tamanho, os mesmos olhos, as mesmas cochas, as mesmas pernas, os mesmos cílios e os mesmos quadris. Um fantasma em uma moldura de recordação. E eu a recordo muito bem.
3- Eu posso muito bem ter entendido errado, eu nem sequer escuto bem. Umas meio-dia e tanto acordo, coloco a música, tomo o café com leite, e passo a observar da janelas os passos das lindas morenas que andam apressadas. Os poemas que Ricardo me mandou são ruins, tristes, e não merecem nem sequer os meus pereceres. Prefiro me suicidar a ter que lê-los novamente. É preciso falar isso na cara dele, e somos amigos, mais o que posso fazer? Nunca gostei de me esconder diante de uma batalha literária. Ele prefere Hesse e eu gosto de Borges. Somos amigos ou inimigos? Eu não sei nem o que estou querendo dizer com tudo isso. É melhor mergulhar em uma prostituta a cair em cima de uma gostosona feminista. Ele e suas frases poéticas. Ele vomita isso com muita crueldade. Toma no cu...
4- Tentei fugir da polícia mais fui pego. Estava roubando um livro (um noves). Deve ser por isso que conseguiram me pegar. Roubar livros sempre foi um vício muito bom, já que todo mundo gosta de jogá-los ainda novos, eu prefiro roubá-los ainda novos. Eu vou explicar isso a Nati quando ela chegar das férias doidonas dela. Ela também sempre foi boa com os dedos para alguns livros. Principalmente romances (os bons, Lispector é uma que ela gosta, as mulheres amam ler mais do que os homens, não me humilhe tanto Nati, você sabe como eu sofro por ser um homem literário). Nati, eu não consegui ler aquelas porcarias do Caio Fernando de Abreu, mais contínuo com enorme tesão diante das obras de Cortázar.... e ainda continuo com enorme tesão por você Nati, e pelos seus livros...
5- Eu nunca fui católico, diga pra ela ler Neruda espiritualmente, e ela vai se sentir como uma pagã. Eu ainda estou lendo Nicanor Parra, e acredite, ninguém nessa favela sabe quem é Nicanor Parra (na verdade ninguém sabe ou entende o que é o Chile). Parra é nome de poeta, embora Borges Jorge Luis tenha dito que um nome horrível para um poeta (e eu I love the humor of Borges), e realmente é mais um nome para um aspirador de pó do que um poeta. Mais Cummings também não é nada lírico ou poético, e na verdade é um poeta. Ou seja: não confundir os pratos sujos ou lavados faz bem. E ela lê Neruda... e ela pensa que é intelectual por isso... (!)
6- (!) Tenho cinco minutos para escrever uma carta de amor para sete poetisas. E depois sete cartas de ódio para sete poetas. Tenho três minutos para respirar, e depois morro totalmente na cama. Ainda bem que passo muito bem sem oxigênio, porque uma atriz porno respira menos do que um poeta, e ela nem sequer sabe o que é poesia... ou seja: a vida é irônica com todos nós, homens, mulheres, gays, travestis, anjos, animais, besouros, insetos, plantas, e por ai vai... Tenho que dizer uma só coisa: ela me esqueceu e eu ainda estou chorando por amor. Há há, isso foi engraçado ou será que não?.... (!)

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