quinta-feira, 31 de julho de 2025

As travestis dos meus olhos



Entre a dobra da dobra do olhar,

onde o espelho não me reconhece,

habitam as travestis dos meus olhos:

delírios com pênis, perfumes e promessas,

sinais de interrogação com cílios postiços.


Eu gozava o gozo do signo.

Na tela, o corpo não era corpo,

mas texto — um corpo que se escreve

com unhas vermelhas e gemidos falsos,

falsos como todo o real que se assume.


A masturbação não era ato — era leitura,

uma hermenêutica da carne encenada,

e cada pixel que piscava era um

supplement do que me faltava.

Meu desejo: uma errância,

meu prazer: um arquivo sempre em fuga.


Não era vergonha. Era presença.

Um modo de habitar o mundo

como quem habita um erro feliz.


Naqueles instantes de punho e luz azul,

eu tocava o impossível:

não o corpo, mas o sentido do corpo,

aquele que escapa, que dança, que ruge.


E me amei ali. Sim, me amei

no abismo entre o masculino e o feminino,

onde as travestis dos meus olhos

sorriam, e diziam:

você também é texto.


E gozar era dizer —

com o sêmen, com o choro,

com o silêncio depois —

que o mundo pode ser belo,

quando se aceita como indecidível.


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