Entre a dobra da dobra do olhar,
onde o espelho não me reconhece,
habitam as travestis dos meus olhos:
delírios com pênis, perfumes e promessas,
sinais de interrogação com cílios postiços.
Eu gozava o gozo do signo.
Na tela, o corpo não era corpo,
mas texto — um corpo que se escreve
com unhas vermelhas e gemidos falsos,
falsos como todo o real que se assume.
A masturbação não era ato — era leitura,
uma hermenêutica da carne encenada,
e cada pixel que piscava era um
supplement do que me faltava.
Meu desejo: uma errância,
meu prazer: um arquivo sempre em fuga.
Não era vergonha. Era presença.
Um modo de habitar o mundo
como quem habita um erro feliz.
Naqueles instantes de punho e luz azul,
eu tocava o impossível:
não o corpo, mas o sentido do corpo,
aquele que escapa, que dança, que ruge.
E me amei ali. Sim, me amei
no abismo entre o masculino e o feminino,
onde as travestis dos meus olhos
sorriam, e diziam:
você também é texto.
E gozar era dizer —
com o sêmen, com o choro,
com o silêncio depois —
que o mundo pode ser belo,
quando se aceita como indecidível.
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