domingo, 16 de novembro de 2025

O OSSO E A ABELHA


O osso:

duro como a sílaba que não cede,

como a cidade que se repete

em seu próprio cimento.


O vazio:

um quarto branco dentro do peito,

um lote vago onde o vento

é o único arquiteto.


O poema:

máquina de cortar sombras,

engenho de limpar a língua,

desenho que só vive se não sobra.


A abelha que segue seu rumo:

disciplina que o mundo ignora,

trabalhadora do instante,

movendo o ar como quem lavra.


São Paulo:

pilha de concreto em febre,

cidade que mastiga o dia

e cospe o resto em névoa.


Rio de Janeiro:

curva onde a luz se inclina,

mas onde o avesso do brilho

também coleciona ferrugens.


Recife:

faca d’água dividindo pontes,

capim salgado nos olhos,

memória que corta rente.


E tudo isso:

bola de fogo rolando no mapa,

país que insiste em se queimar

para ver se acende.



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