Entraram com ele na sala.
Uma lâmpada suja, uma mesa.
De um lado, homens de terno.
Do outro, uma multidão sem rosto.
O juiz bateu o martelo:
— Acusado, o senhor confirma ter usado o guarda-roupa?
Ele respondeu:
— Sim. Entrei e saí em outro mundo.
As árvores tinham olhos.
As pedras falavam.
Eu vi minha mãe morta, viva.
Os advogados riram.
As paredes tremeram como gelatina.
Um promotor cuspiu palavras secas:
— Mentira. Delírio. Obscenidade.
Ninguém atravessa um móvel velho.
Guarda-roupas não são portais.
Ele tentou explicar:
— A madeira cheirava a infância.
As portas rangiam como sinos.
Atravessei, eu juro.
Estava lá, eu vi.
O tribunal inteiro levantou-se de uma só vez,
como se fossem uma plateia ensaiada.
A sentença veio limpa, cortante:
— O réu está louco.
Não há julgamento.
Não há crime.
Não há tribunal.
E então, tudo se dissolveu.
As togas sumiram.
O martelo virou colher.
A mesa, uma maca.
O público, enfermeiros de branco.
E o juiz, sorrindo com dentes podres, disse:
— Aqui não existe guarda-roupa.
Só existe você.
E este hospício.
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