Fumo o meu cigarro como quem esquece.
O lume arde na ponta,
um pequeno sol inútil,
um instante de eternidade que se consome.
O cigarro não é vício,
é metáfora.
É o tempo que se queima em cinza,
é a vida que se dissolve em fumo,
é o pensamento que se eleva
e logo desaparece.
Enquanto fumo,
sinto-me dono de uma liberdade falsa,
como se o mundo fosse apenas
a tragada seguinte.
E talvez seja.
Porque o cigarro não promete nada
além de si mesmo.
E nisso, é mais honesto
que os deuses e que os homens.
Fumo porque sim.
Porque a brasa é um relógio silencioso,
porque o fumo escreve poemas no ar
que ninguém lerá,
porque há uma paz estranha
em assistir ao próprio desaparecimento
em pequenas baforadas.
Não há filosofia mais clara que esta:
sou como o cigarro que fumo,
feito de corpo e de cinza,
ardendo no tempo,
gastando-me,
até ao fim.
E quando acabo,
quando a ponta se apaga,
não há tragédia —
há apenas o chão sujo
e o silêncio da vida
que continua sem mim.
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