Era começo de inverno em São Paulo.
A menina esperava o ônibus no Largo da Batata quando viu o rapaz parado na esquina.
Ele usava um casaco cinza, muito simples, e olhava fixamente para o nada.
Parecia deslocado — como se tivesse saído de outra época.
Ela se aproximou.
— Você está perdido? — perguntou.
Ele sorriu levemente, um sorriso cansado.
— Não. Estou apenas procurando voltar.
A voz tinha um sotaque suave, estrangeiro, mas antigo.
Conversaram pouco.
Ele disse que era japonês, um soldado da Segunda Guerra.
Disse que havia atravessado mares e batalhas, e que agora estava ali,
naquele ponto da cidade, sem saber por quê.
Ela não acreditou de imediato. Mas a presença dele
tinha uma densidade que a impedia de duvidar completamente.
O ônibus chegou, parou, partiu.
E ele continuava imóvel, cercado pela neblina inesperada da noite paulista.
Então, de repente, o rapaz começou a caminhar.
A cada passo, a neblina se adensava.
Ela tentou segui-lo, mas ele desapareceu.
Apenas o silêncio ficou no ar, úmido, frio, carregado.
No chão, perto do ponto, havia uma fotografia.
Ela se abaixou e pegou.
Era antiga, amarelada.
Mostrava um jovem japonês em uniforme militar.
Em casa, mais tarde, levou a foto à mãe.
A mãe olhou com atenção, surpresa, depois sorriu,
um sorriso cheio de algo que parecia saudade.
— Esse é seu avô.
A menina voltou para o quarto.
Deitou-se com a foto entre as mãos.
Lá fora, a cidade seguia barulhenta, indiferente.
Mas dentro dela, uma estranha paz se espalhava,
como a mesma neblina em que o rapaz havia sumido.
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