No coração de São Paulo, entre prédios que pareciam tocar o céu cinza, vivia Kenji, um nipo-brasileiro de olhar distante e mãos sempre inquietas.
Passava os dias entre cafés silenciosos e livrarias empoeiradas, pensando no mundo que o irritava com sua maldade, nas notícias que falavam de guerras, mentiras e indiferença.
Decidiu então, numa tarde sem sol, que a única forma de justiça seria a destruição completa. Uma bomba nuclear, disse a si mesmo, seria a resposta. Nos cadernos espalhados pelo quarto, rabiscava fórmulas impossíveis, esquemas que só ele compreendia, enquanto jazz tocava baixo no velho toca-discos. Mas havia algo estranho nos sons da cidade, no bater da chuva contra a janela, nas sombras dos prédios que pareciam se inclinar sobre ele.
Cada equação que completava trazia não alívio, mas um frio na espinha. Sentiu então, com uma clareza dolorosa, o peso absoluto de sua intenção.
Naquela mesma noite, Kenji saiu à rua. Respirou fundo o ar úmido, tocou a água das poças e percebeu que a vida, ainda que frágil e maldosa, era bonita demais para ser apagada. A bomba se desfez em silêncio dentro de sua mente, como fumaça que escapa por frestas de madeira.
No dia seguinte, começou a plantar rosas. Pequenos botões vermelhos surgiam entre a terra molhada, e cada pétala lembrava-lhe que, mesmo num mundo cruel, ainda existia espaço para cuidado, silêncio e beleza. Kenji ainda caminhava pelas ruas de concreto, mas agora suas mãos carregavam sementes, não destruição. O jazz ainda tocava, e ele sorria, quase imperceptível, para a vida que persistia.
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