Minha literatura é fria,
como o vento que atravessa janelas esquecidas,
como o luar que cai sobre quintais vazios.
Ela guarda o eco de palavras mortas,
a sombra de ideias que já não existem.
Escrevo, e o tempo me observa, paciente e impiedoso.
Cada letra é marca em areia que o mar apaga.
Cada página é ponte sobre um rio que corre para o fim,
onde nada permanece, nem o nome, nem a memória.
As memórias se desfazem como névoa.
Vejo rostos que já não reconheço,
lugares que desapareceram sob a chuva ou o abandono,
e sinto que tudo que escrevi
não passará de pó entre os dedos.
O fim está presente em cada frase.
A morte não é apenas do corpo, mas do instante,
do gesto, da palavra que não se repete.
E a literatura, fria como ela é,
revela a verdade do desaparecimento.
Às vezes, tento capturar a beleza que fui,
as lembranças que pensei eternas,
mas elas escorrem entre minhas mãos,
como água entre pedras lisas de um rio seco.
O silêncio me responde.
Ele não condena, mas não conforta.
Ele é testemunha da fragilidade da vida,
da transitoriedade de tudo que é amado,
e da inexorável passagem do tempo.
Mesmo assim escrevo.
Não para escapar do fim, mas para olhar de frente,
para meditar sobre o que permanece na ausência:
o cheiro da página, a curva da letra,
a sensação de ter tentado eternizar o efêmero.
Minha literatura é memória congelada,
um espelho de sombras,
um caderno de esperanças que morreram antes de florescer.
E nela encontro a minha própria solitude,
a consciência de que tudo é transitório,
e que o homem nada possui além do instante.
Ainda assim, há um fio tênue de beleza:
a percepção de que a fragilidade é humana,
que o desaparecimento é natural,
e que escrever é um gesto de coragem,
uma resistência silenciosa contra a completa nulidade.
Cada palavra é réstia de lume,
cada parágrafo, sinal de que existi,
mesmo que ninguém jamais leia,
mesmo que o mundo inteiro se desfaça
e eu junto com ele.
O tempo segue seu curso inexorável,
e a literatura fria se acumula como neve sobre ossos antigos.
Mas no frio há clareza,
na solidão, contemplação,
e no fim, uma estranha forma de eternidade:
não a da presença, mas da lembrança que se esforça para sobreviver.
Minha literatura é fria, mas é minha.
E nela encontro a paz de saber
que, mesmo diante do desaparecimento de tudo,
a tentativa de eternizar é já um gesto de vida,
um suspiro contra o silêncio do tempo,
uma meditação sobre o que somos
antes que o mundo nos esqueça.
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