quarta-feira, 13 de agosto de 2025

O OURIÇO



o ouriço caminha devagar,

uma esfera de espinhos delicadamente organizada,

cada ponto erguido como um gesto contido,

uma armadura natural que não ameaça,

mas anuncia prudência, atenção, curiosidade.

assim também a mulher esbelta,

que passa pela rua com ombros retos,

pescoço alongado, passos silenciosos,

como se medisse o mundo

com olhos que sabem de onde vêm

e para onde vão.

o ouriço rola entre folhas secas,

os espinhos se erguem ao menor toque,

e o corpo inteiro é uma cápsula de defesa,

uma estrutura que protege a carne macia,

o coração que pulsa lento, constante.

a mulher esbelta dobra o braço

como quem oculta alguma lembrança,

recolhe o cabelo atrás da orelha,

como se o vento pudesse ferir,

como se o toque de mãos alheias

fosse um estímulo perigoso demais.

o ouriço se alimenta de insetos,

de folhas caídas, de pequenos frutos esquecidos,

e cada movimento é exato, racional,

mas não há pressa;

há uma paciência que lembra o ar frio da manhã.


a mulher esbelta caminha pelo mercado,

passa pelos vendedores, pelas crianças,

ela observa sem tocar,

colhe informações da voz, do gesto, do olhar

como quem guarda sementes para o futuro.


o ouriço se encolhe diante de sombras,

mas não finge, não mente,

o seu recuo é genuíno, honesto,

um aviso silencioso:

não confunda cuidado com medo.

a mulher esbelta sorri uma vez,

curva levemente os lábios,

e logo recolhe o gesto

como quem sabe que o mundo não merece

toda a verdade de um sorriso.


o ouriço dorme enrolado,

uma esfera completa, firme, protegida,

mas mesmo na quietude,

há uma tensão contida,

uma presença que exige respeito.

a mulher esbelta senta-se à sombra de uma árvore,

os braços cruzados sobre o colo,

os olhos olhando o chão e o céu ao mesmo tempo,

ela respira devagar,

cada suspiro um pequeno desenho

de autocontrole e beleza inata.

o ouriço e a mulher esbelta

compartilham o silêncio do mundo,

a calma estudada,

a elegância de quem não precisa gritar

para afirmar sua existência.


os espinhos brilham à luz da manhã,

como se fossem jóias minúsculas,

o corpo se curva, se molda, se protege.

os passos dela ecoam pelo corredor da casa,

uma cadência quase musical,

um ritmo que sabe dos limites,

um equilíbrio que desafia a gravidade

e o olhar alheio.


o ouriço atravessa a trilha de folhas mortas,

uma esfera viva de precauções,

uma lição silenciosa sobre resistência,

sobre a beleza que não depende de aplauso.


a mulher esbelta observa o mundo

como se cada movimento fosse parte de um mapa secreto,

cada gesto dos outros, uma indicação de rota,

cada palavra, uma pedra que pode machucar

ou sustentar a própria arquitetura do dia.

e assim o ouriço e a mulher esbelta

prosseguem,

um pelo bosque, outro pela rua,

ambos com a mesma dignidade calma,

a mesma precisão silenciosa,

a mesma capacidade de impressionar

sem jamais se submeter.

o ouriço se esconde, a mulher se recolhe,

mas o mundo percebe,

a vida respeita,

e a beleza, sempre, permanece intacta.



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