o ouriço caminha devagar,
uma esfera de espinhos delicadamente organizada,
cada ponto erguido como um gesto contido,
uma armadura natural que não ameaça,
mas anuncia prudência, atenção, curiosidade.
assim também a mulher esbelta,
que passa pela rua com ombros retos,
pescoço alongado, passos silenciosos,
como se medisse o mundo
com olhos que sabem de onde vêm
e para onde vão.
o ouriço rola entre folhas secas,
os espinhos se erguem ao menor toque,
e o corpo inteiro é uma cápsula de defesa,
uma estrutura que protege a carne macia,
o coração que pulsa lento, constante.
a mulher esbelta dobra o braço
como quem oculta alguma lembrança,
recolhe o cabelo atrás da orelha,
como se o vento pudesse ferir,
como se o toque de mãos alheias
fosse um estímulo perigoso demais.
o ouriço se alimenta de insetos,
de folhas caídas, de pequenos frutos esquecidos,
e cada movimento é exato, racional,
mas não há pressa;
há uma paciência que lembra o ar frio da manhã.
a mulher esbelta caminha pelo mercado,
passa pelos vendedores, pelas crianças,
ela observa sem tocar,
colhe informações da voz, do gesto, do olhar
como quem guarda sementes para o futuro.
o ouriço se encolhe diante de sombras,
mas não finge, não mente,
o seu recuo é genuíno, honesto,
um aviso silencioso:
não confunda cuidado com medo.
a mulher esbelta sorri uma vez,
curva levemente os lábios,
e logo recolhe o gesto
como quem sabe que o mundo não merece
toda a verdade de um sorriso.
o ouriço dorme enrolado,
uma esfera completa, firme, protegida,
mas mesmo na quietude,
há uma tensão contida,
uma presença que exige respeito.
a mulher esbelta senta-se à sombra de uma árvore,
os braços cruzados sobre o colo,
os olhos olhando o chão e o céu ao mesmo tempo,
ela respira devagar,
cada suspiro um pequeno desenho
de autocontrole e beleza inata.
o ouriço e a mulher esbelta
compartilham o silêncio do mundo,
a calma estudada,
a elegância de quem não precisa gritar
para afirmar sua existência.
os espinhos brilham à luz da manhã,
como se fossem jóias minúsculas,
o corpo se curva, se molda, se protege.
os passos dela ecoam pelo corredor da casa,
uma cadência quase musical,
um ritmo que sabe dos limites,
um equilíbrio que desafia a gravidade
e o olhar alheio.
o ouriço atravessa a trilha de folhas mortas,
uma esfera viva de precauções,
uma lição silenciosa sobre resistência,
sobre a beleza que não depende de aplauso.
a mulher esbelta observa o mundo
como se cada movimento fosse parte de um mapa secreto,
cada gesto dos outros, uma indicação de rota,
cada palavra, uma pedra que pode machucar
ou sustentar a própria arquitetura do dia.
e assim o ouriço e a mulher esbelta
prosseguem,
um pelo bosque, outro pela rua,
ambos com a mesma dignidade calma,
a mesma precisão silenciosa,
a mesma capacidade de impressionar
sem jamais se submeter.
o ouriço se esconde, a mulher se recolhe,
mas o mundo percebe,
a vida respeita,
e a beleza, sempre, permanece intacta.
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