MULHER MAMANDO UM CAVALO
Na relva azul do tempo
a mulher ergueu-se, estrela,
e o cavalo, feito raio,
bebeu-lhe da boca o destino.
Era o leite da aurora,
era a crina do vento,
era o mugido do espaço
em soluços de fogo.
Mamava não carne, mas cosmos,
não músculo, mas centelha,
o cavalo cuspia relâmpagos,
a mulher devolvia oceanos.
E juntos, na vertigem,
inventaram a palavra primeira:
**AMOR**,
um tropel de sílabas selvagens
que até hoje galopa
na garganta do mundo.
O Beijo
O beijo não toca, explode.
Entre dentes e nuvens,
uma chama se espalha
como se a boca fosse infinito.
O gosto da tua sombra
gruda nos meus ossos,
e mesmo o silêncio se curva
à urgência da tua língua.
Entre nós,
o ar se encolhe e depois grita,
e tudo que é sólido
derrete-se na língua do instante.
Não é amor.
Não é dor.
É a eletricidade
que nos rasga a pele
e nos devolve à loucura
como se o mundo fosse só isso:
um beijo que queima o céu inteiro.
MAMANDO UM CAVALO
galope-troa
no ventre do som,
ela sibila-lamba,
mordo-masiva
o selvagem de escuro pelame
neve-tipo de língua
resbala no corpo-lombo,
tremeluz,
crec-crec de dentes e sussurros
entre dentes e campo
oh cavalo!
estou tua boca,
meu beijo é selva,
é fôlego de mato e martelo
que bate no tambor do teu cio
zumbolho,
sobe e desce,
lambe-lança,
meu amor é pata, casco,
rugido que explode no silêncio
galopa, galopa, selvagem
e eu — boca-mundo,
te alimento de mim
como se fosses inteiro
e eu, inteira também
Entre a cama, o relógio e eu
Entre a cama, o relógio e eu
há uma noite que respira em silêncio,
e o tempo, como água escura,
escorre pelas bordas do meu sono.
O ponteiro hesita, inquieto,
como se soubesse dos segredos
que a escuridão murmura
entre o lençol e a pele.
Eu, imóvel, escuto o ritmo
da vida que se arrasta e se dobra,
como sombra de pássaro noturno
sobre o mármore frio do instante.
E tudo — o tic-tac, o suspiro da cama,
o murmúrio dos sonhos que não vêm —
se dobra em meu peito,
como se o mundo inteiro fosse
uma pausa,
e eu, apenas, seu eco.
Pintor e Modelo
Oh, o pintor e o modelo —
cintilam como neon em quarto abafado,
a luz elétrica tremendo sobre corpos nus,
a tinta escorrendo dos dedos como sangue doce,
e cada linha do corpo se torna poema
sob o olhar ardente da mão do artista.
Ele murmura cores no seu ouvido,
verde, carmesim, azul como sexo antigo,
e o modelo arqueia —
não é vergonha, é êxtase,
os músculos cantam, a pele grita
cada toque, cada pincelada, cada suspiro.
Eu vejo: a respiração entrecortada,
o cheiro da tinta misturado com suor,
a boca do pintor próxima à orelha do modelo,
um amor que não pede desculpas,
um amor que atravessa paredes, ruas, mundos.
E a cidade lá fora dorme,
mas aqui dentro tudo vibra, explode, pulsa,
o quadro nasce de gemidos e cores,
e o pintor e o modelo
são apenas dois corpos eternos
derramando amor e loucura na mesma tela.





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