terça-feira, 6 de março de 2018

DENTRO DO ESPELHO

DENTRO DO ESPELHO

...voluit cotidie ...


Foi um susto. E que susto. Lá estava ele. Era um homem dentro. Dentro, bem fundo, do espelho. Me olhava, me encarava, tentei decifrá-lo. Interroguei-o:
-O que faz aí dentro? Dentro, bem fundo, desse espelho?

A boca se mexia. Os olhos me encaravam. A resposta veio fria:

-Desse espelho, bem fundo, dentro? Dentro aí o que faz?
 Eu te perguntei primeiro, rapaz.  E o rapaz só me olhava. Me encarava.

Os olhos castanhos, os cabelos loiros. As mãos se levantavam. Queria me dizer algo, pedir socorro, talvez, ou talvez me contar lendas, belas histórias que nunca tinha ouvido. 

De repente, outro susto insuportável. Colocou-se de lado uma linda mulher, bela, bonita, traços orientais, cabelos lisos e negros, olhos puxados. Sorriu para o homem dentro do espelho. E a minha esposa sorria ao meu lado.
-Quem são esses?
-Já perguntei. O cara não respondeu nada.
-O que você quer para o jantar?
-Não sei. Um miojo. 

O homem dentro do espelho sorria. Sua estranha companhia havia sumido. De repente aquele homem de barbas compridas estava nu, feito um ovo. Um ovo. O objeto mais claro e cru que existe.

Era eu dentro do espelho. Mas isso vai fazer cinco anos. Foi a primeira vez que me vi, sem me reconhecer, dentro do espelho.

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