A chegada da morte na natureza
(pequena peça)
Lua branca
Eu sei, eu sei, é o escuro,
é o silêncio, a nuvem que passa,
o sol que se levanta,
a natureza que dança.
Lua negra
Onde está a voz
da noite que chora?
Eu estava...
Lua branca
Onde estavas?
Lua negra
Não me lembro.
O sol me tapou com as mãos.
Me cortou, me feriu, me sangrou.
as luas saem. entram a morte e a vida
Morte
Pois não?
Vida
Sou a vida.
Morte
Certo!
Vida
Que fazes aqui?
Morte
Estou vendo
as árvores serem
cortadas pelos homens.
Vida
E eu!
Morte
Vês as nascentes
de água sendo sujadas
pelos seres humanos?
Vida
Não são seres humanos.
Morte
O que são?
Vida
Comida de vermes.
Morte
Não fales assim.
Vida
É lento o inverno.
Morte
Adeus então.
Vida
Adeus morte.
Morte
Adeus vida.
se despedem. saem. entram a árvore e o pastorzinho
Árvore
Que é o amor, pastorzinho?
Pastorzinho
Não sei. Eu estava mirando
num sonho lento de gafanhoto
uma lua branca e uma lua negra
conversando.
Árvore
E o que falavam de tão interessante?
Pastorzinho
A morte e a vida
também apareceram
no papel do meu coração.
Árvore
Não te creio, Pastorzinho.
Pastorzinho
Não me crês? Eu creio em Cristo!
Árvore
O que falava de tão interessante
a morte e a vida?
Pastorzinho
Uma e outra se odeiam.
Árvore
Não te creio, Pastorzinho.
Pastorzinho
Não me crês? Eu creio em Cristo.
Árvore
O que diziam?
Pastorzinho
Que a vida e a morte
ferem a natureza.
Árvore
Te creio, agora, remanso de campo.
Pastorzinho
E que os homens ferem as árvores
com machadinhos e os rios com feridas;
Árvores
Te creio.
Pastorzinho
Sou homem.
Árvore
O que fazes?
Pastorzinho
Te firo.
A Árvore cortada cae sangrando, morta.
O Pastorzinho recita o poema que se segue:
-Nasceu e morreu
a árvore do meu jardim.
Fiquei só com a madeira
que cortei só para mim.
Tombou as folhas dos galhos,
nas eras que se seguem,
luares negros e luares claros,
vida e morte, sinfonias serenas.
Machadinhos que ferem
bem fundo o sangue da madeira.
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